Todos morrem um pouco a cada dia.

No quarto, sobre a cama, um lençol branco enrugado: resquícios de um sono intranqüilo. Dois passos adiante outra porta. Está em pé. Intacto, e olha fixamente seus olhos no espelho. Está gelado e pálido e ainda transpira um suor salgado do esforço que havia feito alguns instantes atrás.
Abre vagarosamente o armário do banheiro, e sem desviar o olhar para onde suas mãos habilidosas se deslocam, alcança uma gilete. Estende o braço esquerdo sobre a pia, sua expressão é fria e neutra, e com um único golpe crava a lâmina em seu pulso, abrindo-lhe um corte considerável. Visão que se embaça e corte sem dor. Suor frio. Sangue frio. Chão frio. Seus joelhos alcançam o chão primeiro dando-lhe um solavanco sem dó. Segundos depois encosta permanentemente sua cabeça no azulejo branco. Seu corpo está estirado no chão de mármore branco do banheiro de sua própria casa, entregue absolutamente a gravidade.
Todos morrem um pouco a cada dia. Mas nem todos respiram a vida aliviados.

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